Adolescentes e jovens, em especial meninas, são as principais vítimas de desaparecimento em Luanda, com base nos registos da associação SOS Desaparecidos em Angola

30/08/2022  09H10

Em todo o mundo, o número de pessoas a desaparecerem diariamente é preocupante, devido as consequências de tais actos.

Viana, Cazenga e Kilamba-Kiaxi são os municípios de Luanda com o maior número de casos registados de pessoas desaparecidas. Para o coordenador da associação SOS Desaparecidos em Angola, Catanha Chilela, é fundamental que os pais e encarregados de educação prestem especial atenção aos filhos, em especial as meninas, dos 13 aos 25 anos, por serem a faixa etária com a maior incidência de casos.

Hoje, adiantou, dia 30 de Agosto, é celebrado no mundo, o Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimento Forçado e a data deve servir de alerta aos pais sobre os riscos aos quais muitos dos filhos estão sujeitos. “Está prática, às vezes e na maioria dos casos, tende a terminar de forma trágica. É preciso inverter o quadro”, disse.

A efeméride, adiantou, não deve ser resumida, simplesmente, às pessoas forçadas ao cárcere, mas também para reflectir na situação daquelas que desaparecem, por enganos na Internet, e acabam sendo abusadas, ou mortas.

Catanha Chilela é de opinião que o problema pode ser melhor resolvido com o apoio das famílias. “Geralmente, devemos considerar de anómala qualquer desaparecimento, seja demorado ou não, de um familiar. É preciso comunicar logo às autoridades, de forma que a intervenção seja célere”.

Quase sempre, continuou, é a falta de atenção a certos comportamentos dos filhos, que leva a situações do género. “Há filhos que saem sem dar satisfação para aonde vão e a prática é desaconselhável”, disse, além de pedir uma resposta mais rápida de todos os envolvidos na solução destes casos. “O processo pode ser moroso, pois é preciso haver, por exemplo, um departamento especializado em pessoas desaparecidas”.

Actualmente, contou, a associação SOS Desaparecidos em Angola tem estado a acompanhar alguns casos de pessoas em cativeiro, de acordo com relatos familiares. “Geralmente, os alertas surgem muito tardiamente, mas fizemos de tudo para ajudar”, conta, acrescentando que algumas das famílias com quem estão a trabalhar, no momento, dizem estar aflitas. “A resposta das investigações tem sido lenta. É necessário ter maior atenção aos casos de sequestro e rapto”, pediu.

“Um dos últimos casos, sobre o qual lamentamos muito, é o de Ana Karina, sequestrada durante três meses, e, infelizmente, encontrada morta. Até hoje, o autor do crime não foi apresentado. Assim como ela, o mesmo aconteceu com Vunda Ferreira. É preciso evitar registos semelhantes”, alertou.

 

Incidências e prevenção

Entre as províncias do país, Luanda, com maior destaque, Benguela e Huíla são as com o maior número de ocorrências de pessoas desaparecidas. “Desde Fevereiro de 2020 já recebemos 243 casos de pessoas desaparecidas, dos quais 16 resultaram em mortes. Mas até hoje, ajudamos a resolver 175 casos”, disse.

O combate a esta prática, continuou, é, também, uma forma de travar o tráfico de seres humanos e de órgãos. “Embora em Angola os casos do género não sejam muito acentuados é preciso que hajam políticas para incentivar a prevenção”.

Às mulheres, Catanha Chilela pede muita atenção, em particular no contacto com pessoas estranhas, com realce aos conhecidos nas redes sociais. “O alerta é para todos, mas com maior enfoque às mulheres e crianças”, disse.

Quase sempre, esclareceu, o perfil das vítimas recai sobre as pessoas dos 13 aos 35 anos. “Claro que o desaparecimento forçado não tem uma idade definida. Algumas vítimas são pessoas observadas pelos meliantes durante dias, antes da acção e podem ter até 50 anos ou mais. Depende dos interesses dos sequestradores ou do momento. A quem é simplesmente vítima do acaso, pois muitos são os relatos de pessoas que acabam envolvidas em situações de terceiros”, acrescentou.

A associação, disse, tem trabalhado com colaboradores nas redes sociais, para maior disseminação da informação dos casos, assim como com o Serviço de Investigação Criminal (SIC), a Polícia Nacional e a população. “O primeiro contacto é feito sempre com a família da vítima”.


Responsabilidade criminal para quem simular um sequestro

Devido as consequências do desaparecimento forçado de pessoas, a advogada Arcangela Zaide alerta todos os que tentarem simular um sequestro para terem cuidado, pois a pena é de 2 a 12 anos de prisão, dependentemente da gravidade.

“A moldura penal para este tipo de crime é de 2 a 8 anos de prisão, que podem ser acrescidos para 12, caso a simulação de sequestro durar mais de 30 dias. Para um desaparecimento ser considerado como tal, basta, de acordo com a alínea d) do n.º 1 do artigo 174.º do Código Penal Angolano (CPA), que a denuncia seja feita, por qualquer cidadão, às autoridades”, explicou.

Em sede de direito penal angolano, elucidou, o sequestro constitui um dos tipos de crime contra a liberdade das pessoas, ao ponto de até a simulação ser punível. “A simples notificação do caso às autoridades policias, ou a denúncia facultativa por qualquer cidadão, já implica o crime, logo quem o simula pode ser punido”.

Nestes casos, acrescenta, mesmo após o seu aparecimento a pessoa deve ser responsabilizada, pela execução do crime e a consumação deste, por uma conduta adequada de elementos constitutivo de um tipo de crime, previsto e punível pelo Código Penal.

“A pena de prisão aplicada ao infractor tem como finalidade, proteger o bem jurídico da comunidade, protelado pela Constituição angolana, e ajudar a reintegrar a pessoa na sociedade, como forma de o desincentivar, também, de comportamentos futuros, assim como por limitar atitudes semelhantes partes de outros cidadãos”, adiantou.



Cuidados

O chefe do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Serviço de Investigação Criminal (SIC) Luanda, Fernando Carvalho, considera o desaparecimento forçado de pessoas um crime, que tem de ser combatido a todo o custo, de forma a não se tornar uma prática perigosa.

A preocupação, destacou, é generalizada, pois a prática continua a ter fortes impactos no mundo. No país, os casos registados, explicou, têm tido o devido acompanhamento. “Todo o cuidado é pouco, em especial agora com o crescente do uso das redes sociais por parte dos adolescentes e jovens”, esclareceu.



A efeméride

A data, instituída pela Organização das Nações Unidas, em 2010, e observada desde 2011, aborda um “problema que se tornou global e já não se limita a uma região”, como refere a ONU.

Neste dia, a ONU pede aos países que assistam as famílias vítimas desse crime, que passam a uma situação Capa do Jornal de Angola, Terça, 30 de Agosto de 2022
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SOCIEDADE
Pais e encarregados de educação alertados a ter mais atenção com os filhos
Carla Bumba
Jornalista
Adolescentes e jovens, em especial meninas, são as principais vítimas de desaparecimento em Luanda, com base nos registos da associação SOS Desaparecidos em Angola

30/08/2022 ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO 09H10


Em todo o mundo, o número de pessoas a desaparecerem diariamente é preocupante, devido as consequências de tais actos © Fotografia por: DR
Viana, Cazenga e Kilamba-Kiaxi são os municípios de Luanda com o maior número de casos registados de pessoas desaparecidas. Para o coordenador da associação SOS Desaparecidos em Angola, Catanha Chilela, é fundamental que os pais e encarregados de educação prestem especial atenção aos filhos, em especial as meninas, dos 13 aos 25 anos, por serem a faixa etária com a maior incidência de casos.

Hoje, adiantou, dia 30 de Agosto, é celebrado no mundo, o Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimento Forçado e a data deve servir de alerta aos pais sobre os riscos aos quais muitos dos filhos estão sujeitos. “Está prática, às vezes e na maioria dos casos, tende a terminar de forma trágica. É preciso inverter o quadro”, disse.

A efeméride, adiantou, não deve ser resumida, simplesmente, às pessoas forçadas ao cárcere, mas também para reflectir na situação daquelas que desaparecem, por enganos na Internet, e acabam sendo abusadas, ou mortas.

Catanha Chilela é de opinião que o problema pode ser melhor resolvido com o apoio das famílias. “Geralmente, devemos considerar de anómala qualquer desaparecimento, seja demorado ou não, de um familiar. É preciso comunicar logo às autoridades, de forma que a intervenção seja célere”.

Quase sempre, continuou, é a falta de atenção a certos comportamentos dos filhos, que leva a situações do género. “Há filhos que saem sem dar satisfação para aonde vão e a prática é desaconselhável”, disse, além de pedir uma resposta mais rápida de todos os envolvidos na solução destes casos. “O processo pode ser moroso, pois é preciso haver, por exemplo, um departamento especializado em pessoas desaparecidas”.

Actualmente, contou, a associação SOS Desaparecidos em Angola tem estado a acompanhar alguns casos de pessoas em cativeiro, de acordo com relatos familiares. “Geralmente, os alertas surgem muito tardiamente, mas fizemos de tudo para ajudar”, conta, acrescentando que algumas das famílias com quem estão a trabalhar, no momento, dizem estar aflitas. “A resposta das investigações tem sido lenta. É necessário ter maior atenção aos casos de sequestro e rapto”, pediu.

“Um dos últimos casos, sobre o qual lamentamos muito, é o de Ana Karina, sequestrada durante três meses, e, infelizmente, encontrada morta. Até hoje, o autor do crime não foi apresentado. Assim como ela, o mesmo aconteceu com Vunda Ferreira. É preciso evitar registos semelhantes”, alertou.



Incidências e prevenção

Entre as províncias do país, Luanda, com maior destaque, Benguela e Huíla são as com o maior número de ocorrências de pessoas desaparecidas. “Desde Fevereiro de 2020 já recebemos 243 casos de pessoas desaparecidas, dos quais 16 resultaram em mortes. Mas até hoje, ajudamos a resolver 175 casos”, disse.

O combate a esta prática, continuou, é, também, uma forma de travar o tráfico de seres humanos e de órgãos. “Embora em Angola os casos do género não sejam muito acentuados é preciso que hajam políticas para incentivar a prevenção”.

Às mulheres, Catanha Chilela pede muita atenção, em particular no contacto com pessoas estranhas, com realce aos conhecidos nas redes sociais. “O alerta é para todos, mas com maior enfoque às mulheres e crianças”, disse.

Quase sempre, esclareceu, o perfil das vítimas recai sobre as pessoas dos 13 aos 35 anos. “Claro que o desaparecimento forçado não tem uma idade definida. Algumas vítimas são pessoas observadas pelos meliantes durante dias, antes da acção e podem ter até 50 anos ou mais. Depende dos interesses dos sequestradores ou do momento. A quem é simplesmente vítima do acaso, pois muitos são os relatos de pessoas que acabam envolvidas em situações de terceiros”, acrescentou.

A associação, disse, tem trabalhado com colaboradores nas redes sociais, para maior disseminação da informação dos casos, assim como com o Serviço de Investigação Criminal (SIC), a Polícia Nacional e a população. “O primeiro contacto é feito sempre com a família da vítima”.


Responsabilidade criminal para quem simular um sequestro

Devido as consequências do desaparecimento forçado de pessoas, a advogada Arcangela Zaide alerta todos os que tentarem simular um sequestro para terem cuidado, pois a pena é de 2 a 12 anos de prisão, dependentemente da gravidade.

“A moldura penal para este tipo de crime é de 2 a 8 anos de prisão, que podem ser acrescidos para 12, caso a simulação de sequestro durar mais de 30 dias. Para um desaparecimento ser considerado como tal, basta, de acordo com a alínea d) do n.º 1 do artigo 174.º do Código Penal Angolano (CPA), que a denuncia seja feita, por qualquer cidadão, às autoridades”, explicou.

Em sede de direito penal angolano, elucidou, o sequestro constitui um dos tipos de crime contra a liberdade das pessoas, ao ponto de até a simulação ser punível. “A simples notificação do caso às autoridades policias, ou a denúncia facultativa por qualquer cidadão, já implica o crime, logo quem o simula pode ser punido”.

Nestes casos, acrescenta, mesmo após o seu aparecimento a pessoa deve ser responsabilizada, pela execução do crime e a consumação deste, por uma conduta adequada de elementos constitutivo de um tipo de crime, previsto e punível pelo Código Penal.

“A pena de prisão aplicada ao infractor tem como finalidade, proteger o bem jurídico da comunidade, protelado pela Constituição angolana, e ajudar a reintegrar a pessoa na sociedade, como forma de o desincentivar, também, de comportamentos futuros, assim como por limitar atitudes semelhantes partes de outros cidadãos”, adiantou.



Cuidados

O chefe do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Serviço de Investigação Criminal (SIC) Luanda, Fernando Carvalho, considera o desaparecimento forçado de pessoas um crime, que tem de ser combatido a todo o custo, de forma a não se tornar uma prática perigosa.

A preocupação, destacou, é generalizada, pois a prática continua a ter fortes impactos no mundo. No país, os casos registados, explicou, têm tido o devido acompanhamento. “Todo o cuidado é pouco, em especial agora com o crescente do uso das redes sociais por parte dos adolescentes e jovens”, esclareceu.



A efeméride

A data, instituída pela Organização das Nações Unidas, em 2010, e observada desde 2011, aborda um “problema que se tornou global e já não se limita a uma região”, como refere a ONU.

Neste dia, a ONU pede aos países que assistam as famílias vítimas desse crime, que passam a uma situação extremamente difícil, pois o crime tende a ter um impacto muito forte entre os familiares, principalmente as mulheres e as crianças.

Em alguns países, como destaca a ONU, existem leis de reparação, mas às vezes as barreiras ao seu cumprimento chegam a ser muitas. Por isso, aconselha, os países a prestarem atenção ao impacto multidimensional dos desaparecimentos forçados para melhor responder às vítimas e à sociedade.

Revista Destemidos